terça-feira, 23 de novembro de 2010

O que é um processo seletivo para emprego e como ele acontece?

Porque selecionar os colaboradores?

Os tempos mudaram no mundo do trabalho. À algum tempo atrás, as pessoas elaboravam seu currículo e iam na portaria de uma empresa deixá-lo. Com sorte, alguém do RH dessa empresa ou mesmo o próprio empresário interessava-se em ver o currículo, e com uma dose ainda maior de sorte, a pessoa que deixou o currículo era exatamente o profissional que o empresário precisava. A maioria das pessoas saía deixando seu currículo em várias empresas, para aumentar as suas chances de alguém lhe dar atenção, e quem sabe contratá-lo.

Ou então algum setor de uma empresa precisava de um novo funcionário, e saía pedindo aos seus próprios funcionários que indicassem pessoas que pudessem ocupar esses cargos. Era o que ficou conhecido, como uma forma de piada, como Q.I. (quem indica), em alusão à medição científica e correta do QI (quociente de inteligência). Claro que se tratava de uma pessoa que indicava a outra, e dessa forma entrava no processo a camaradagem, a troca de favores e muitas vezes mesmo o nepotismo.

Conforme o tempo passou, os empresários verificaram que precisam saber quem está entrando em sua empresa, não basta apenas deixá-lo entrar. Conhecer suas habilidades, sua formação, e que tipo de comportamento terão lá dentro. Era necessário então métodos para prever se essa pessoa que estava entrando, era uma pessoa que daria conta do recado. Os métodos antigos não eram bons para esse tipo de verificação.

E não podemos dizer que eles, os empresários e empregadores, estão errados. Contratar uma pessoa errada para um cargo numa empresa pode gerar problemas e despesas, muitas despesas. Para cada pessoa contratada em nosso país, com carteira assinada, gasta-se mais de 100% o salário de pessoa com impostos e encargos. Ou seja, se contrato um colaborador com um salário de 1000 reais, mais de 1000 reais vão sair do meu bolso, além do salário, para cobrir impostos e encargos com essa contratação.

Se eu contrato errado, meu colaborador não corresponde, e eu preciso demití-lo, pagarei várias outras despesas com o desligamento. Se esse colaborador, no tempo em que esteve trabalhando para mim, cometeu algum erro, porque não era qualificado para fazer o que eu queria que ele fizesse, então é até difícil contabilizar o prejuízo que ele me deu com esse erro. Fora o risco dele, ao sair, sentir-se injustiçado e me acionar na justiça por danos morais.

O outro lado deve ser visto também. Se estou procurando emprego, e minha cultura é completamente incompatível com o que se espera de mim numa empresa com uma cultura mais rígida, então eu vou ter problemas lá dentro. Se por exemplo, sou muito melhor trabalhando com carga horária flexível, e entro numa empresa que exige 10 horas diárias, eu não vou render o que posso, e problemas poderão surgir. Se a forma com a qual as pessoas se comportam na empresa é formal, e eu me comporto informalmente, mais cedo ou mais tarde serei advertido. 

Isso causará transtorno ao empregador e ao colaborador. Haverá perda de produtividade e inclusive muita gente que não está envolvida diretamente nisso pode se prejudicar.

E é aí que entram os processos seletivos. Eles ligam a pessoa que está procurando um emprego, à empresa que está procurando uma pessoa. Mas ao fazer essa ligação, lança mão de uma série de procedimentos para verificar se esse casamento vai dar certo.

Algumas empresas possuem seus próprios métodos, com o próprio departamento de Recursos Humanos realizando esse procedimento. Outras, preferem terceirizar esse serviço e acionam empresas especializadas em Recrutamento e Seleção. Por isso, muitas vezes pessoas são chamadas a fazer o processo em uma empresa, com vistas a ser selecionada em outra. É porque essa empresa onde foi feito o processo, é uma empresa que foi contratada para fazer apenas esse trabalho. É o caso da Gestalt, nós recrutamos e selecionamos pessoas para as empresas que são nossas clientes ;-)

Vamos agora mostrar, de forma simples, clara e detalhada, como funciona um processo seletivo. Isso é necessário porque esse processo não é do conhecimento de todas as pessoas, principalmente o público leigo. Considere que ao ver um anúncio, e ser chamado para um processo seletivo ou participar de um concurso, há vários termos utilizados pelos selecionadores que para os leigos, se parecem somente com avaliações psicológicas (que também são usadas no processo), o que os torna ansiosos pelo resultado.  Entender como funciona este processo pode auxiliar a diminuir a ansiedade natural de quem está buscando uma nova colocação.

Os termos técnicos e expressões podem confundir, mas são fases de um processo cada vez mais complexo que visa apenas contratar os melhores profissionais e garantir que ele permaneça na empresa o maior tempo possível.   

1. Anúncio

É uma declaração pública de uma empresa indicando a necessidade de contratar um profissional para atuar em um cargo específico.   Esta declaração acontece de forma direcionada, pode ser divulgado em: jornais, internet, rede de contatos, instituições de ensino aprendizado, SINES, conselhos regionais de cada curso, sempre visando atingir especificamente o perfil desejado nesta vaga, considerando um valor para divulgação estabelecido. 

A divulgação tanto é mais usada quanto mais difícil for achar aquele profissional necessário. Dessa forma , não precisamos anunciar em jornais de grande circulação uma vaga para operador de produção, por exemplo, pois são profissionais encontrados com certa facilidade no mercado. 

O objetivo aqui é o primário, tentar buscar esse profissional de acordo com o que suas fontes podem oferecer. Precisamos encontrá-lo, e para encontrá-lo, anunciamos para chamar sua atenção.

2. Triagem

Imagine então, que uma vez anunciada a vaga, devem aparecer várias pessoas querendo essa vaga. O trabalho de triagem é como uma peneira. Dessas várias pessoas, precisamos definir quais as que mais atendem aos pré-requisitos, e que portanto podem passar para as fases seguintes do processo seletivo.

Fazemos isso através da análise desses currículos e por isso no outro artigo mostramos como é importante você saber fazer corretamente seu currículo. O objetivo é escolher os melhores perfis analisando os históricos escolares, empregos anteriores e identificar as habilidades necessárias.  Dependendo do tipo de vaga pode-se triar de 10 a 15 currículos para uma vaga. 

Leva-se em consideração, ainda, os candidatos que acabam faltando, ficam inaptos na entrevista, e assim por diante, por isso sempre tentamos gerar um número médio de candidatos que possa cobrir essas possíveis faltas. 

Podem ser usadas pequenas entrevistas de triagem para verificar esses pontos. Por isso, o momento da triagem é de extrema importância ao candidato. Considerando o risco de ser descartado sem uma entrevista formal ( próximo passo), recomendamos extremo cuidado neste primeiro contato. A primeira impressão, nesse caso, é a que costuma ficar. E define sua passagem para o próximo passo.


É necessário ainda fazer uma ressalva. Nessa etapa do processo, muitas empresas costumam negligenciar a ética com os candidatos, deixando-os em longas filas, ou tratando-os de modo autômato, como se gado fossem. É preciso ter a sensibilidade de entender que para cada empresa de seleção, o candidato é fundamental em sua atividade, mas muito mais importante é o processo para o próprio candidato. Muitas pessoas dirigem-se aos seus processos seletivos com o objetivo de conquistar seus sustento, a paz de espírito, a sobrevivência de uma família. E essas histórias particulares não devem ser desrespeitadas com um atendimento mal educado e planejamentos mal realizados. A Gestalt reitera seu compromisso de tratar com ética e dignidade, cordialmente, todos seus candidatos, em todos as etapas do processo seletivo.

3. Entrevista

É realizada com quem passou pelo processo de triagem, o que deve ter reduzido o número de candidatos pela metade, aproximadamente. Dessa forma, todos os candidatos que chamaram atenção pelo currículo, na fase de triagem, agora terão que passar por uma entrevista completa, onde vários aspectos serão analisados.

A entrevista visa aprofundar as informações do currículo e entender as aspirações do candidato, por exemplo. A capacidade de se expressar verbalmente, de solucionar problemas, e sua motivação para buscar aquela vaga são esclarecidas aqui. Para mais dicas de como passar por essa fase, consulte nosso artigo sobre dicas de como se comportar nesse processo.

4. Técnicas adicionais de seleção

Dependendo da vaga em que estamos selecionando pessoas, algumas informações adicionais que precisamos ter podem ser buscadas, que talvez não tenham ficado tão claras com uma entrevista. Por exemplo, existem os chamados cargos estratégicos, que exigem pessoas com alto grau de habilidades em uma área específica, precisa ter um comportamento bem definido, criatividade e flexibilidade. Cargos de gerência costumam ser estratégicos, pois são pessoas que ficarão responsáveis por chefiar grupos de outros trabalhadores, e por isso vão lidar com responsabilidades maiores em suas empresas. Dessa forma, precisamos usar mais técnicas além da entrevista para nos certificar que essas pessoas possuem essas características. Três são as técnicas mais conhecidas:

Dinâmica de grupo - São diversas atividades aplicadas com o objetivo de analisar o desempenho do candidato em equipe e detectar comportamentos e competências compatíveis ao cargo pretendido pelo candidato. Normalmente são situações criadas (não precisam ser simulações de situações reais), para verificar como essa pessoa se comportaria quando estivesse lidando com uma situação real, que exija a mesma habilidade que essa situação criada. Para vagas em que a pessoa deva lidar com conflitos com uma certa rapidez, podemos simular uma situação de conflito e observar como ele irá se sair. Assim, caso se saia bem, significa que provavelmente saberá lidar com situações que exijam a mesma habilidade quando estiver em seu cargo.  Durante as atividades, o selecionador observa o desempenho de cada candidato.

Provas situacionais - Agora sim são simulações de problemas rotineiros ocorridos na empresa em que o candidato deverá atuar como se já estivesse contratado. Quanto mais alto o cargo, menor a possibilidade de o selecionador aplicar testes como esses. Eles são bastante utilizados para a contratação de trainees e estagiários. Costuma-se pedir a candidatos a vendedor, por exemplo, que tentem vender um produto fictício para verificar se ele possui as habilidades necessárias para tal.

Avaliação psicológica - São diversos testes aplicados durante o processo seletivo para analisar aspectos da intelectualidade, personalidade e a coordenação motora do candidato. Nem todas as empresas aplicam testes deste tipo.  Eles não são eliminatórios, podem parecer estranhos, mas possuem um objetivo bem estabelecido, que não precisa necessariamente ser explicado ao candidato.  É importante lembrar que o teste não é uma prova. Você não ganha uma nota por ele que irá colocá-lo ou não no emprego. Ele avalia algumas de suas características, e isso somado à sua entrevista e a todas as etapas anteriores, irá definir se você segue ou não. É, portanto, apenas uma técnica auxiliar, não uma técnica que define, sozinha, sua entrada na vaga.

5. Provas específicas

Essas sim, são provas, e servem para confirmar as habilidades que o candidato diz ter. Alguns cargos requerem, por exemplo, inglês avançado (fluente). Dessa forma, provas de inglês podem ser aplicadas para verificar se a informação no currículo é verdadeira. Existem ainda provas de conhecimentos gerais, de matemática, entre outras. Não são aplicadas sempre, apenas quando se verifica a necessidade.

Por isso ressaltamos a importância de ser sempre honesto quando for fazer seu currículo. Pois um exagero de habilidades, quando detectado, conta como ponto negativo no processo.


6. Devolutiva (Feedback)

Consiste em duas coisas. No caso de uma pessoa participar do processo e cometer um erro que a prejudicou, os selecionadores podem dar dicas para que na próxima vez que forem passar por uma seleção, não cometa o mesmo erro. Por exemplo, uma vestimenta inadequada, ou um comportamento não desejável, podem ser corrigidos com um feedback. Isso ao mesmo tempo aumenta a experiência e chance do candidato nas próximas vezes, e ajuda a educar o público, transformando os candidatos em candidatos melhores no futuro. É uma prática boa para candidatos, empresas e selecionadores.

Também é devolutiva informar ao candidato sobre sua situação, se foi selecionado para a próxima fase, ou se não foi. Por incrível que pareça, muitas pessoas não são informadas, e ficam ansiosas esperando um telefonema sobre o resultado, quando se tratam de selecionadores que negligenciam a ansiedade dos candidatos que não foram selecionados. Informá-lo é um gesto simples e ético, extremamente necessário. Ambos os tipos de feedback são procedimento padrão da Gestalt ;-)

7. Resumo e observações

De forma simples, a sequência é essa. Nós aunciamos a vaga, você nos manda seu currículo. Se o seu currículo for o que procuramos, chamamos você para conhecê-lo melhor na triagem. Se mostrar-se apto, faremos uma entrevista, se necessário, usando algumas das técnicas adicionais. Após um tempo elaborando os resultados, entramos em contato para informar do resultado. 

Se você foi selecionado, será mandado diretamente para o empregador, juntamente com nosso relatório sobre você. Será, então, entrevistado por ele e poderá aí conquistar seu emprego.

Se não for selecionado, seu currículo permanecerá em nosso banco de dados para futuras vagas que venham a ser abertas com seu perfil, e você poderá ter uma nova chance.

Importante ainda que você mantenha sempre seu currículo atualizado, caso haja mudanças nele, envie nova cópia para os bancos de dados para os quais você já havia enviado.

A Gestalt possui banco de dados próprio de currículo. Para enviar o seu, mande para selecao.gestalt@gmail.com

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Esperamos que essas informações tirem suas dúvidas sobre o processo seletivo e aumente suas chances quando for passar por um. ;-)




Nívia Cristiny
Andre Borghi


quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Psicólogos contribuem para um mundo sem regras, porque acham tudo normal ?

Esse mito, ou essa idéia, é bastante complexa, e portanto merece mais atenção ao ser tratada. Primeiro precisamos entender algumas coisas.

Como determinar o que é normal?

O que é normal muda conforme o tempo:

A idéia de normal e anormal não é uma coisa estática. Ou seja, uma coisa normal não é sempre normal e uma coisa anormal não é sempre anormal.  Essa idéia vai mudando com o tempo. Basta olharmos nossa própria história e ver como os costumes mudam ao passar dos anos.

Alguns anos atrás os homens tinha sempre a premissa de cortejar as mulheres, ou seja, eles tomavam a iniciativa de tentar algo com elas. Haviam os namorinhos de portão, a relação quase sempre iniciava no namoro com vistas para o casamento. Para esse momento, seguiam-se alguns rituais como pedir a mão da moça em casamento para os pais, precisar provar que era um bom moço (de boa família e trabalhador), e o sexo apenas após o casamento era observado como uma virtude de ambos os pombinhos. Isso era o comportamento normal.

Hoje em dia, qualquer pessoa nos anos 1980 e posteriores, sabe que existem novos modos de relacionamento (ficar, por exemplo), modelos diferentes de compromisso, e as moças não dependem tanto mais da aprovação dos pais para casarem-se, de modo que muitos daqueles rituais não existem mais. O sexo é menos um tabu e mais um comportamento visto como normal entre não casados, com exceções de algumas alas que conservam o tradicionalismo por motivos religiosos.  Portanto, ao longo do tempo, a sociedade foi mudando, e o que era comportamento normal à alguns anos atrás hoje é visto como resquício de romantismo de décadas passadas.

As mulheres no mercado de trabalho são outro excelente exemplo. Antes as moças eram educadas para serem donas de casa, saberem cozinhar e serem modelos de esposas submissas que deveriam ser ajudantes de seus maridos quando estes chegavam cansados do trabalho, e o sexo do casal era prioritariamente para render prazer ao homem, cabendo às mulheres a função de servidão neste quesito. Uma mulher com estas características era considerada normal, para não dizer exemplar. As mulheres que fugiam disso, rebeldes.

Hoje as vemos conquistando o mercado de trabalho, cada vez mais consolidadas. Existem profissões em que elas são maioria, e sabemos cientificamente de algumas qualidades tipicamente femininas que as fazem serem melhores que qualquer homem em algumas funções, como as que exigem motricidade fina, por exemplo, em linhas de produção com peças pequenas que exigem mais habilidade e menos força, ou em áreas que exigem da pessoa fazer várias coisas ao mesmo tempo, como telefonistas e secretárias, bem como administradoras. Além da habilidade de lidarem com jornada dupla, como o trabalho e o cuidado com os filhos.

Com o advento da pílula anticoncepcional, as mulheres passaram na prática e simbologicamente a ter mais controle sobre sua própria vida sexual, deixando de serem serventes dos homens. Agora elas não precisavam mais fazer sexo apenas para fins de procriação e podiam aproveitar a prática para seu próprio prazer também.

Portanto, a mulher de décadas atrás e a mulher atual seguem padrões diferentes, e anormal passa a ser essa mulher de antigamente, vista hoje como “amélia”, ou “dependente do marido”. Estamos observando um tempo de mudanças, em que pessoalmente acredito ser feliz e benéfica, pois equilibra a balança dos direitos entre seres humanos e derruba um pouco mais o machismo.
Portanto, como você pode ver, através de dois exemplos simples, conforme passa o tempo, a idéia de normal e anormal vai mudando junto.

O que é normal muda conforme o lugar e a cultura:

Não apenas o tempo, mas a geografia do lugar, o local, e a cultura tornam diferentes o que é normal. Observemos por exemplo as características típicas dos japoneses, de sempre dedicarem-se ao máximo no que fazem e o quanto se cobram pelos resultados. Nós, ocidentais, facilmente poderíamos vê-los como perfeccionistas, mas eles poderiam nos ver como descompromissados. É a diferença do olhar, do que é considerado normal. Mais próximo de nós, podemos ver a diferença dos habitantes das grandes cidades e dos habitantes do campo. Não é diferente? Ora, o habitante do campo tem em seu cotidiano atividades diferentes, necessidades diferentes, experiências e crenças em geral diferentes. 

Os índios, ou os nativos africanos, ou ainda os aborígenes australianos, todos possuem costumes diferentes que podem parecer bizarros aos nossos olhos. Se um deles nos visitassem em uma de nossas grandes cidades, poderíamos facilmente achá-los loucos, ou anormais. Mas onde eles vivem, em seu meio, nós é que somos anormais. Nossas roupas é que seriam curiosas para eles, nosso desapego pela natureza é que seria ofensiva para eles, e não o costume o de algumas tribos de índios de abandonar crianças com deficiências.

É a diferença dos seres humanos. E nunca funciona quando julgamos uma cultura diferente pelo olhar da nossa própria, isso tende a gerar sempre o preconceito. É uma premissa da Antropologia que deve ser assimilada pelos psicólogos que quiserem verdadeiramente estudar o comportamento humano.

O que é normal muda conforme as circunstâncias:

Pensemos agora num país que acaba de entrar em guerra na época da Segunda Guerra Mundial.  Antes os habitantes que podiam andar livremente nas ruas, precisam estar prontos a esconderem-se no subsolo e a lutar por sua nação. Alguém que ande nessa época despreocupadamente pelas ruas ou que não demonstre apreensão pela situação provavelmente seria taxado de louco, anormal.

Ou pensemos na aterrorizante possibilidade de uma epidemia em larga escala de alguma doença que seja transmitida pelo contato físico.  Veríamos rapidamente pessoas lavando as mãos com uma frequência muito maior e evitando locais com muita gente. Qualquer pessoa que não conhecesse a circunstância estaria propenso a imaginar que as pessoas estão ficando obsessivas com a própria higiene. No entanto, a circunstância motivou tal comportamento.

Há casos, extremos como nos exemplos que citei, ou muito mais cotidianos, em que uma circunstância motiva a mudança de comportamento das pessoas e com isso a idéia de normal começa a variar também.

A violência urbana e a criminalidade, por exemplo, não nos dão um quê paranóico muito grande? Fechamo-nos em grades, com alarmes, alguns com carros blindados, e algumas pessoas chegam a evitar saírem de casa para compromissos sociais. Estamos ficando loucos, somos anormais? Não, somos produto de uma circunstância diferente, e se uma pessoa morar numa casa sem muros e cheia de vidro num bairro conhecidamente perigoso, não será ela que chamaremos de anormal?

Então, como se define o que é normal?

Com todas essas variações - e elas estão ligadas entre elas - não há um modo de definir o que é normal que seja satisfatório e justo. Ou se tentássemos, precisaríamos mudar nossa idéia a todo momento, e apenas tratar e oferecer nossos serviços a seres humanos minimamente parecidos conosco. Ou então, seríamos como grupos tradicionalistas que consideram o normal como imutável, e veríamos assustados as mudanças do mundo como sempre sendo coisas ruins, ou quem sabe sairíamos numa cruzada querendo mostrar como “nosso jeito de viver” é o certo e porque todos deveriam ser como nós. Isso não ajudaria a Psicologia em absolutamente nada, e nos tornaria julgadores conservacionistas, e não cientistas do comportamento humano.

Normalidade como força da maioria e como uma definição social

No entanto, a sociedade humana desde sempre teve uma definição do que é normal ou anormal. E como ela faz isso?

Na maioria daz vezes, quem define a normalidade é a maioria. Se num dado país a maioria da população considera um “jeito de ser” como normal, qualquer pessoa que saia desse jeito, automaticamente está no campo do anormal. E não funciona apenas com maioria numérica, ou seja, número de pessoas. Funciona também com grupos, que mesmo tendo menos pessoas, detém o poder de ditar as regras.

À alguns anos atrás, vimos a triste história do Apartheid, em que uma minoria branca oprimia a maioria negra na África do Sul, por considerá-los inferiores, portanto, fora da linha de normalidade em que eles próprios julgavam estar. Felizmente, isso acabou e hoje o país tenta se erguer como uma nação democrática, mas o exemplo pode ser visto em vários outros momentos históricos da humanidade.

A normalidade é definida socialmente. É uma construção da sociedade que muda, mas a cada momento em que alguém foge a essa construção, é taxado de anormal. Portanto, enquanto psicólogos, não acreditamos que tratar de normal e anormal nos ajude em algo, e portanto não usamos essas definições de forma científica.

Hoje em dia quase não se vê ninguém apontar um deficiente físico e chamá-lo de anormal. É com infelicidade que uso o “quase”, mas felizmente estamos aprendendo a mudar alguns conceitos e ver que a taxação de anormal fere as pessoas. Por vezes torna-se ainda mais nocivo que o próprio problema delas, como no caso do preconceito aos portadores de HIV.

Se estamos aprendendo isso, porque continuamos livremente chamando de anormais pessoas que possuem transtornos mentais ? Porque achamos que uma deficiência física merece nosso respeito e um problema mental não merece? Porque tantas pessoas morrem de vergonha de admitir que possuem algum problema de ordem psicológica mais do que teriam de admitir que possuem algum problema de ordem física?

Por essas contradições tristes que a humanidade ainda possui, precisamos mudar nossa atuação, e trabalhar com normal e anormal simplesmente não é eficiente para ajudar alguém.

Adaptação ao ambiente e circunstância:

A Psicologia funciona melhor quando trabalha com a questão da adaptação ao meio em que a pessoa vive. Quando falo de meio, falo da cultura em que ela está inserida, das atividades que ela exerce, e como ela lida com tudo isso que rodeia sua vida.

Vamos a um exemplo mais prático. Imagine que João que é um civil, e está vivendo num país que está em guerra, e de repente se veja a todo momento num tiroteio. Se ele tiver uma reação de pânico para manter sua própria vida, correr, tiver todos os sintomas de ansiedade, chorar, ou ficar paralisado em algum canto, ele está apenas tendo a reação que eu ou você teríamos, pois ele não tem treinamento para se defender de uma situação dessas e está querendo fugir do risco de morte.

Agora imagine José, que mora no terceiro andar de um prédio em um país estável que não está em guerra e sente-se aterrorizado toda vez que precisa pegar um elevador, a ponto de ter um ataque de pânico enquanto está dentro dele. Ora, um elevador não oferece a princípio um nível de risco para causar essa reação. Mas ele sente-se desse modo. A princípio estaríamos inclinados a dizer que se trata de um fóbico.

 No entanto, toda vez que José precisa sair de casa, ele tem a opção de descer pelas escadas e evitar a fonte de seu medo, o elevador. José conseguiu portanto adaptar-se à sua situação, ao seu meio, de modo que agora ele sempre utiliza as escadas e ter medo do elevador não causa prejuízos em sua vida a ponto de precisar de ajuda de um profissional, assim como utilizar as escadas não causa prejuízo a outras pessoas com quem convive ou divide o condomínio. É provável que José tenha uma fobia relacionada ao elevador sim, mas ele encontrou um modo de viver com isso satisfatoriamente. Portanto, está adaptado à vida que leva e ao seu meio, mesmo com sua provável fobia.

Agora imagine outra situação, em que José não mora no terceiro andar de um apartamento. Ele mora no trigésimo andar de seu apartamento, e trabalha num prédio cujo escritório fica no quinquagésimo andar. Ele teria que descer 30 níveis de escada todos os dias, e subir outros 50 apenas chegar no seu ambiente de trabalho. A partir do momento que isso se torna insuportável para José, causando prejuízos a sua vida, ele não está mais adaptado ao seu meio, e por isso ele passa a procurar ajuda profissional. Tem medo de precisar mudar-se para uma casa e perder seu emprego. Com isso, por causa de sua fobia, sua família toda precisaria ser realocada. Agora sim temos o quadro de alguém que precisa de ajuda, pois o problema afeta a ele e as pessoas próximas de modo que cause prejuízos.

Como você pode ver, sabemos que uma pessoa está adaptada ou desadaptada, quando problemas começam a surgir em sua vida de modo a lhe causar prejuízos e/ou a outras pessoas. Quando usamos os tratados de diagnóstico, como a CID-10 e o DSM-4, todos eles citam como critério para diagnosticar o fato de a pessoa precisar relatar que o problema lhe causa sofrimento e/ou causa sofrimento a outros.

É preciso ainda diferenciar a linha tênue entre sofrimento e incômodo. Em geral, diferenças causam incômodo, como no caso de pessoas que possuem opinião diferente da maioria. Se não tomarmos esse cuidado, podemos nos pegar tratando pessoas que por suas opiniões causam incômodos aos outros. Ou você nunca viu alguém ser chamado de louco ou mandado procurar um psicólogo simplesmente porque emitiu uma opinião divergente da maioria?

 A liberdade do ser humano deve ser tomada como algo sempre a ser respeitado pela Psicologia, e a constituição de nosso país garante a liberdade de opinião e igualdade de direitos entre os cidadãos, por mais que na prática não funcione sempre assim.

Portanto um casal homossexual que mostre afeto em público não é um caso a ser tratado, porque um casal heterossexual que fizesse a mesma coisa também não seria. No caso de fazerem sexo no meio da rua, tanto o casal hétero como o casal homossexual estaria entrando no crime de atentado ao pudor, e se isso for um a atitude recorrente, provavelmente ambos precisariam de ajuda. O fiel da balança não é a orientação sexual, e sim o comportamento e sua adaptação ao meio (nesse caso, o nível inapropriado de demonstração do afeto em público)

Óbvio que pelas crenças cristalizadas de nossa sociedade isso poderia provocar incômodos em quem assistisse a cena do simples afeto no caso do casal homossexual, mas gerar incômodo não é motivo pertinente para dizer que uma pessoa está desadaptada, e portanto, precise de ajuda.

Assim como fumantes. É claro que estão provocando malefícios ao seu organismo, mas se isso não causa prejuízo a outros (saber fumar sem tornar os outros como fumantes passivos, por exemplo), e o próprio indivíduo o faz porque gosta e conhece os riscos, o problema é inteiramente dele. No caso de um fumante pedir ajuda da Psicologia para deixar de fumar, aí sim, passará a ser problema nosso também e iremos tratá-lo no sentido de ajudá-lo a cumprir seu objetivo, pois o tabagismo trata-se de uma adicção, que pode ser tratada com ajuda dos métodos da Psicologia.

Se um homossexual pedir ajuda para lidar com os problemas de sua sexualidade, ou seja, sua orientação sexual lhe causa sofrimentos, iremos ajudar no sentido de fazê-lo se conhecer e aceitar-se ou conhecer-se como tal, amenizando o sofrimento, mas nunca iremos tratá-lo para deixar de ser homossexual, por mais que alguns psicólogos já tenham manchado nosso nome com tal atitude reprovável e ilícita anteriormente, pois isso é completamente vedado pelas leis de nossos Conselhos. Assim como trataríamos um heterossexual que peça ajuda para lidar com problemas em sua sexualidade, da mesma forma. Mais uma vez, orientação sexual não é o fiel da balança para a Psicologia.

Portanto respondendo àquela pergunta do início, nós não achamos tudo normal, simplesmente porque não trabalhamos com essa idéia.

E quanto menos utilizarmos esse tipo de classificação, melhor será para apagar essa imagem errônea que o grande público pode ter de nós. De forma alguma contribuímos para um mundo sem regras, já que o que fazemos é exatamente respeitar a liberdade individual e tratar cada pessoa como única, ajudando a superar seus problemas, sempre dentro das leis estabelecidas.

Casos complicados, nem tanto:


Há casos mais complicados que em geral são usados como argumento pelos defensores dessa idéia. Como por exemplo nos perguntar se consideramos os pedófilos pessoas normais. Ora, se uma pessoa possuir predileção sexual por menores de idade e sabendo que é crime e prejudicial dar vazão a esse desejo, conseguir suprimí-lo, é possível que sequer um dia saibamos que essa possui possui essa preferência.

Mas se suprimir esse desejo lhe causa sofrimento, ele precisa de ajuda e estará desadaptado. Se, pior ainda, cometer o ato de pedofilia por causa dessa predileção, causará prejuízos à vítima e a si mesmo, precisando ainda mais ser ajudado, e estando completamente desadaptado ao meio, pois terá cometido um ato que atenta contra a lei e o direito das crianças e adolescentes, além do que esse caso não ficaria apenas nos domínios da Psicologia ou Psiquiatria, mas seria também de ordem criminal.

O que buscamos, portanto, é o equilíbrio. Para podermos ajudar as pessoas que precisam ser ajudadas, respeitando sua liberdade e, ao contrário do que alguns possam pensar, contribuir para um mundo melhor. Cada caso é pensado individualmente, e não parte do achismo. Parte de nossa formação e da orientação de nosso código de ética.

A moralidade não cabe à ciência. Definir certo e errado é como tentar definir normal e anormal, ou bom e mau. A famoso raciocínio polarizado, ou seja, ou é bom ou é mau, ou é normal ou é anormal, é por demais simplista para uma ciência humana. Muitas outras coisas precisam ser analisadas e consideradas.

À Psicologia cabe usar seus conhecimentos para ajudar cada pessoa como ela é, com todas as suas diferenças e circustâncias - e variações que existem por causa disso-  tentando ajudá-las a ter uma vida com qualidade, adaptada ao meio em que está inserida, dentro de nossas leis, mesmo que com todas as suas particularidades preservadas.

Se gostamos do que fazemos e temos carinho pela Psicologia, devemos tratá-la como tal, e isso inclui esclarecer certas imagens equivocadas que se formam, por vezes devido a nossa própria culpa. A Psicologia não deve ficar numa redoma de vidro ou taxada de arte, alheia às pessoas. Não somos artistas, somos cientistas e profissionais que devemos informar o grande público e usar o que temos pelo bem da sociedade.



Andre Borghi

Psicólogos não podem ir a bares, à baladas ou sair para onde possam encontrar seus pacientes na noite?

Em nossa profissão, há psicólogos que defendem o comportamento de evitar locais em que possam ser encontrados por seus pacientes, na esperança de defender uma imagem ideal de profissionalismo. E há aqueles que acreditam que isso é um tabu sem necessidade.

Eu faço parte do segundo grupo. Volto a frisar que somos seres humanos, que no ambiente de trabalho somos profissionais. Assim, o psicólogo clínico deve evitar algumas coisas em seu consultório e momento de trabalho, como o psicólogo organizacional deve evitar algumas coisas em seu ambiente de trabalho. Mas fora dele, somos pessoas que temos direito a lazer, e a fazer o que gostamos de fazer. Isso é válido para qualquer profissão e para qualquer ser humano.

Policiais, por exemplo, são impedidos de ingerir bebidas alcoólicas quando estão em serviço. Mas quando estão de folga, não há nada que os impeça de tomar sua cervejinha, afinal, não estão de serviço.
No mundo de hoje, é quase impossível que um psicólogo consiga imaginar onde pode encontrar seus pacientes, e com isso evitá-los.

 Ao sair para uma balada, uma danceteria, um barzinho que seja, não há como saber com certeza quem estará lá. E na realidade, encontrar pacientes em locais como esse não deveria ser um problema. Primeiro que fora do consultório, seu paciente também é um ser humano que pode viver como bem entende, ele não é naquele momento seu paciente. Ele é quando está nas sessões. E você não é seu psicólogo, você é quando está trabalhando. Ali, caso se encontrem em um bar, por exemplo, são duas pessoas que tem uma relação de serviço, mas que são simplesmente pessoas. Podem se cumprimentar, conversar, como quaisquer duas pessoas fariam.
O paciente solicita os serviços do psicólogo para ser ajudada em algo, e não para dar-lhe satisfações de tudo de sua vida, da mesma forma que o psicólogo é solicitado para agir profissionalmente, e não precisa dar satisfações de sua própria vida pessoal. Os encontros casuais não afetam em nada o tratamento quando a relação é bem estabelecida entre ambos nas sessões.

Nós próprios sabemos como é saudável que a vida tenha várias facetas. O momento do trabalho, o momento da família, o momento do lazer, o momento do descanso. Se nós próprios agirmos como se respirássemos 24h a Psicologia e tivermos um comportamento demasiado rígido para ter uma imagem imaculada, estaremos na verdade projetando uma imagem contrária aquilo que nós mesmos costumamos sugerir aos pacientes.




Andre Borghi

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Psicólogos irão tentar fazer você mudar de religião?

Símbolos do
 Cristianismo

A mesma frase que encerra o mito da homossexualidade, é válida para este. A escolha da orientação religiosa de uma pessoa é seu direito garantido pela Constituição Brasileira, faz parte de suas liberdades pessoais e não deve sofrer intervenção de nenhum profissional de Psicologia.

Buda, símbolo
do Budismo
Num país múltipla cultura como o Brasil, embora de maioria cristã e direcionamento quase não-laico nesse sentido, é muito comum que um profissional de saúde mental tenha que lidar com o que representa a diferença de suas próprias crenças.

Símbolo do
 Islamismo
De fato, psicólogos são treinados a atenderem pessoas de toda variedade cultural e religiosa, buscando ajudar seus pacientes sem induzi-los a uma religião específica, ou incentivá-lo a retirar-se de uma. As crenças pessoais de um indivíduo fazem parte dele como um todo, é o que faz cada pessoa ser quem ela é, e as crenças religiosas ou mesmo a ausência delas (ateus) estão inclusas, e devem ser respeitadas, segundo as resoluções próprias da profissão.

Cena representando orixás,
 da Umbanda
Se uma pessoa estiver em tratamento e durante este resolver converter-se para uma religião, ou retirar-se de uma, deve ser claro e transparente que essa decisão partiu tão somente da própria pessoa, e nunca como uma sugestão ou indução de seu terapeuta, e menos ainda como parte do tratamento.

Nunca é demais repetir, pois aspectos religiosos não são técnicas científicas e não podem ser utilizados como tal por profissionais de Psicologia. A escolha religiosa de cada indivíduo, portanto, diz respeito apenas a ele na relação entre paciente e psicólogo.
Estrela da Davi, símbolo
do Judaísmo

Shiva, um dos deuses
 do Hinduísmo
Complicações dessa questão normalmente são vistas quando os psicólogos deixam que sua própria orientação religiosa interfira em seu profissionalismo. No entanto, temos suficiente formação e treinamento para sabermos lidar com a separação desses dois aspectos.

 Um bom psicólogo que seja cristão, deve saber tratar respeitosa e profissionalmente um paciente que seja budista, por exemplo, e essas diferenças não devem ser fatores relevantes de prejuízo na condução do treinamento, se for feito corretamente e dentro da ética.
Representação de um xamã indígena,
da tribo americana Sioux

Se um psicólogo, portanto, sugeriu que você abandone sua fé pelo seu bem, ou que ao contrário, deveria aderir a alguma outra ou mesmo a dele próprio, saiba que isso não deveria ter sido feito.












Andre Borghi

Psicólogos tratam homossexualidade ?

Psicólogos não tratam homossexualidade simplesmente porque ela não é uma doença. Não é vista dessa forma pela Psicologia, e é oficialmente considerada como orientação sexual pela Organização Mundial da Saúde, o que fez com caísse em desuso a palavra homossexualismo, já que o sufixo “ismo”, na área de saúde, geralmente é usado para doenças.

Essa é a forma pela qual a ciência trata a questão, embora infelizmente outros círculos , como algumas religiões e culturas, ainda considere por uma questão de crença que a homossexualidade seja uma doença, e portanto, algo curável. É considerada crime em alguns países direcionados por crenças fundamentalistas.

Que não é uma doença ou desvio de comportamento já sabemos. Mas pesquisas na área vêm demonstrando que a orientação sexual não é uma escolha propriamente dita, mas que existe uma determinação genética, de funcionamento físico inclusive passando pelo mecanismo de feromônios e diferenças cerebrais. Quando se diz na Psicologia do Desenvolvimento que a tríade da personalidade é formada na adolescência, e com ela a orientação sexual seria “definida” nessa época, podemos estar confundindo com uma “descoberta”. Nesse sentido, pelo que a ciência vem encontrando ultimamente, em determinado momento a pessoa não se torna homossexual, mas na verdade toma consciência de sua orientação sexual, já previamente influenciada. As pressões sociais e a pressão advinda da própria pessoa, na dificuldade de admitir pertencer a uma minoria que costuma ser alvo de preconceito, poderiam atrasar, ou por meio de negação, complicar essa tomada de consciência, no vocabulário popular, “sair do armário”.

Isto é, confirmando essas evidências atuais, tratar uma pessoa homossexual para que deixe de sê-lo não tem apenas implicações éticas, no sentindo de afrontar a liberdade pessoal de um indivíduo, como seria completamente ineficaz, com consequências ruins a própria pessoa. Algo como tratar uma pessoa negra para ser branca, ou vice-versa, ou seja, além de expor inutilmente a pessoa a procedimentos inúteis e anti-éticos, não faz o menor sentido.

As afirmações insistentes de “patologizar” uma orientação sexual parte somente de questões culturais, definidas por mecanismos sociais, não encontrando nenhuma justificativa científica.
Aos psicólogos, portanto, é totalmente vedado qualquer tratamento que considere a homossexualidade como doença a ser tratada.

Recentemente, uma psicóloga chamada Rozângela Justino, foi punida com ato de censura pública pelo Conselho Federal de Psicologia, por promover e defender psicoterapias que conseguiriam, segundo ela, reverter a homossexualidade para comportamento heterossexual.

A psicóloga, que é ligada a igrejas evangélicas e provavelmente não soube separar corretamente suas crenças pessoais de seu exercício profissional e científico, pode ainda ter seu registro cassado. A notícia é de conhecimento popular pela imprensa e pode ser verificada por simples buscas na internet.

Segundo a fonte do Correio Braziliense, “Pesa contra Rozangela Justino a acusação de ter desrespeitado uma resolução do Conselho Federal de Psicologia, baixada em 22 de março de 1999, numerada como 1/99. Essa norma, que deve nortear o exercício da profissão, diz que “a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão”. O parágrafo único da resolução destaca que “os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades”.

Atos como esse infelizmente ainda podem ser cometidos por profissionais que não respeitam as próprias resoluções de seu código de ética da profissão, e freqüentemente misturam o que aprenderam na faculdade como ciência para sua atuação, com aquilo que acreditam pessoalmente em termos culturais, religiosos e pessoais. Repetindo: não há fundamentação científica para afirmar que o comportamento homossexual seja patológico ou que apenas o comportamento heterossexual seja o correto.

Há algum tempo, usava-se o argumento de que apenas a espécie humana apresentava comportamento sexual, não sendo encontrado nenhum análogo no reino animal, e que portanto tal conduta viria de “erros” na complexa personalidade humana, e nunca com uma base puramente biológica. O argumento hoje é obsoleto, tendo em vista que o comportamento sexual é verificado em diversas espécies animais, em muitos casos servindo de mecanismos da evolução da espécie, por mais contraditório que possa parecer.

Muito  menos ainda existem indícios que uma “psicoterapia” dessa natureza seja efetiva. A única base para tal afirmação é religiosa, e portanto não compete à Psicologia tal forma de “tratamento”.
A liberdade individual de cada indivíduo deve ser respeitada durante qualquer serviço ministrado por um psicólogo. 


Fontes para notícia:






Andre Borghi